Sobre as diferenças e semelhanças entre o Catolicismo Romano e o Anglicanismo

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As diferenças, nos principais pontos de religião, entre os católicos romanos e nós da Igreja da Inglaterra; juntamente com os acordos que nós de nossa parte professamos e estamos prontos a aceitar, se eles de seu lado estiverem tão preparados a concordar conosco nesses pontos.

AS DIFERENÇAS

Nós, professamos a fé e a religião na Igreja da Inglaterra, não concordamos com a Igreja Romana em todas aquelas coisas para as quais ela agora procura converter-nos. Mas totalmente nos distinguimos dela (assim como ela da Igreja Antiga) nos seguintes pontos:

1. Que a Igreja de Roma é a mãe e mestra de todas as outras igrejas do mundo;

2. Que o papa de Roma é o vigário-geral de Cristo ou que ele tem uma jurisdição universal sobre todos os cristãos que serão salvos;

3. Que o Concílio de Trento foi um concílio ecumênico ou que todos os seus cânones devem ser recebidos como matéria de fé católica, sob pena de condenação;

4. Que Cristo instituiu sete verdadeiros sacramentos propriamente ditos no Novo Testamento, nem mais nem menos, todos conferindo graça e necessários para a salvação;

5. Que os sacerdotes oferecem nosso Salvador na missa como um sacrifício propiciatório real o próprio, em favor dos vivos e dos mortos, e que todo aquele que não crê é condenado eternamente;

6.Que no sacramento da eucaristia toda a substância do pão é mudada para a substância do corpo de Cristo e toda a substância do vinho em seu sangue, tão verdadeira e propriamente que, depois da consagração, não permanece mais pão e vinho; o que eles chamam transubstanciação e impõem para ser crido sob pena de condenação;

7. Que a comunhão sob uma espécie é suficiente e legítima (não obstante Cristo ter instituído em ambas) e que qualquer um que crê diversamente está condenado;

8. Que existe um purgatório depois desta vida onde as almas dos mortos são punidas e de onde são tiradas pelas orações e ofertas dos vidos; e que não é possível haver salvação para quem não crê nisto;

9. Que todos os antigos santos falecidos e todos aqueles mortos, homens ou mulheres, que o papa ultimamente canonizou como santos, ou que futuramente canonizará, quaisquer que sejam, são e devem ser invocados em orações religiosas e nas devoções de todas as pessoas; e que os que não crêem isto como sendo artigo de fé católica não podem ser salvos;

10. Que as relíquias de todos esses verdadeiros ou supostos santos devem ser religiosamente veneradas; e que quem afirmar o contrário é condenado;

11. Que as imagens de Cristo, da bem-aventurada Virgem e dos outros santos não só devem ser possuídas guardadas, mas ainda honradas e cultuadas, segundo o uso e as práticas da Igreja Romana; e que isto deve ser crido como necessário para a salvação;

12. Que o poder e o uso das indulgências, tal como agora são praticadas na Igreja de Roma, tanto em favor dos vivos como dos mortos, devem ser aceitos e cridos por todos sob pena de eterna perdição;

13. Que todas as cerimônias usadas pela Igreja Romana na administração dos sacramentos (tais como saliva e sal no batismo; as cinco cruzes sobre o altar e o sacramento da eucaristia; a elevação deste sacramento por cima da cabeça do sacerdote para ser adorado; a exposição dele nas igrejas para ser adorado pelo povo; o seu carregamento pelas ruas em procissão no dia que chamam de Corpus Christi, bem como para junto dos doentes; o óleo e o crisma na confirmação; a unção dos ouvidos, dos olhos, do nariz, das mãos, dos rins daqueles que estão prestes a morrer; a entrega de um cálice e de uma patena vazia àqueles que são ordenados sacerdotes; e muitas desta espécie que estão em uso entre eles) são necessárias para a salvação e devem ser aprovadas e admitidas por todas as outras igrejas;

14. Que todas as observações e constituições eclesiásticas da mesma Igreja (tais como as leis que proíbem a todos os sacerdotes de se casarem; a existência de diferentes ordens de monges, freis e freiras na igreja; o serviço de Deus numa língua desconhecida; a recitação de um determinado número de ave-marias, contadas nos rosários; a aspersão de si próprios e dos corpos dos mortos com água benta como operativa e efetiva da remissão de pecados veniais; a distinção de carnes a ser observada para o verdadeiro jejum; a consagração religiosa e a incensão de imagens; o batismo de sinos; a dedicação de diferentes dias santos para a Imaculada Conceição e a assunção corporal da bem-aventurada Virgem, para o Corpus Christi ou a transubstanciação do sacramento; a transformação dos livros apócrifos de modo que sejam tão canônicos como os outros das santas e indubitáveis Escrituras; a guarda dessas Escrituras longe do uso livre e da leitura do povo; a aprovação de sua única tradução latina; e diversas outras matérias da mesma natureza) devem ser aprovadas, mantidas, cridas como necessárias para a salvação, e quem não as aprova está fora da Igreja Católica e deve ser condenado.

Afirmamos que todas essas coisas são, sob diferentes aspectos, ou perniciosas ou desnecessárias, algumas falsas, algumas agradáveis, mas nenhuma deve ser imposta a qualquer igreja ou a quaisquer cristãos, como fazem os católicos romanos que as impõem a todos os cristãos e a todas as igrejas, como matérias necessárias pata a eterna salvação.

AS CONCORDÂNCIAS

Se os católicos romanos fizerem consistir a essência de sua Igreja, como nós, nos seguintes pontos, estamos de acordo com eles na aceitação e na crença seguinte:

1. Todos os vinte e dois livros canônicos do Antigo Testamento e os vinte e sete do Novo, como o único fundamento e perfeita regra de nossa fé;

2. Todos os apostólicos e antigos credos, especialmente aqueles que são comumente chamados de credo Apostólico, de credo Niceno e de credo de Santo Atanásio, os quais são claramente deduzidos da Sagrada Escritura;

3. Todos os decretos de fé e doutrina emanados tanto dos primeiros quatro concílios gerais, como de todos os outros concílios que esses primeiros quatro aprovaram e confirmaram, e além disto dos quinto e sexto (pois outros não julgamos que tenham sido gerais), e de todos os concílios seguintes que concordam com aqueles; bem como todos os anátemas e condenações emanados desses concílios contra os hereges, para a defesa da fé católica.

4. O consentimento unânime e geral dos santos padres católicos e da Igreja Universal de Cristo na interpretação das Sagradas Escrituras, bem como as coleções de todos os assuntos necessários de fé a partir deles durante os seis primeiros séculos, e a seguir até os nossos dias;

5. No reconhecimento do bispo de Roma – se ele governasse e se deixasse governar segundo os antigos cânones da Igreja – como Patriarca do Ocidente, por direito de constituição eclesiástica e imperial, naqueles lugares em que os reis e governadores o aceitaram como tal e julgaram conveniente fazer uso de sua jurisdição, mas sem dependência necessária dele por direito divino;

6. Na recepção e no uso dos dois benditos sacramentos de nosso Salvador; na confirmação daquelas pessoas que devem ser fortalecidas na sua fé cristã pela oração e imposição das mãos, segundo o uso dos santos apóstolos e antigos bispos da Igreja Católica; na pública e solene bênção das pessoas que são reunidas no santo matrimônio; na absolvição pública ou privada dos pecadores penitentes; na consagração dos bispos; na ordenação de sacerdotes e diáconos para o serviço de Deus em sua Igreja, através de uma sucessão legítima; na visita aos doentes, orando por eles e administrando-lhes o bendito sacramento juntamente com uma absolvição final dos pecados de que se arrependeram;

7. Na celebração eucarística do sacrifício do corpo e do sangue de Cristo, oferecido realmente uma vez por nós;

8. No reconhecimento de sua presença sacramental, espiritual, verdadeira e real nas almas de todos aqueles que vêm, com fé e devoção, recebê-lo segundo sua própria instituição neste santo sacramento;

9. No oferecimento de gratidão a Deus por aqueles que partiram desta vida na verdadeira fé da Igreja Católica de Cristo; e na oração a Deus a fim de que tenham uma alegre ressurreição e uma perfeita consumação na felicidade, tanto em seus corpos como em suas almas no eterno reino de sua glória;

10. No uso histórico e moderado de imagens pintadas e verdadeiras, quer para lembrança ou ornamento, onde não houver perigo de que se abuse delas ou de que sejam cultuadas com honras religiosas;

11. No uso das indulgências ou abatimento do rigor dos cânones impostos aos transgressores, na medida de seu arrependimento e sua vontade de os suportar;

12. Na administração dos dois sacramentos e outros ritos da Igreja com cerimônias decentes e ordeiras, segundo o preceito dos apóstolos e a livre prática dos antigos cristãos;

13. Na observação daqueles dias e tempos santos de jejum que estavam em uso nas primeiras eras da Igreja ou que foram aceitos depois por motivos justos, por autoridades públicas e legítimas;

14. Finalmente, na recepção de todas as constituições e cânones eclesiásticos feitos para a ordem na Igreja ou de outros que não repugnam a Palavra de Deus nem ao poder dos reis ou às leis estabelecidas por autoridades legítimas em qualquer nação.

Comentário do Revmo. Dr. John Cosin (1594–1672), Bispo de DurhamFonte: Uma carta à Condessa de Peterborough, Works, ed. L.AG.T,. IV. 332-336.

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